Nos
comboios dos caminhões velhos, com os nativos, alguns sem os dentes, dois com a
pele negra de tanto sol, embora a pigmentação do rosto fosse alva como a minha,
mas o árduo trabalho ao sol desenvolveu tal característica. Há
alguns balaios, com futas, animais sem vida e fumo, muito fumo, a economia
deste povoado não é tao rica, e estou numa posição confortável, sob a lona da
carroceria e a fuligem, a fuligem da terra, a poeira, a misteriosa poeira que
ergue-se sobre nossas cabeças e levam os suspiros e as lamentações, caindo por
terra e extirpando a dor para o ar.
Nada aqui é tao gratificante quanto a
refeição, se pudesse escolher, não olharia para os cantos e os vãos das casas
nesta cidade, creio que esteja no oriente, mas não sei onde, um lugar onde se
comem frutas e insetos, pessoas que brigam por comida e o luxo não é conhecido
pela maioria.
Há trabalhadores, muitos, autônomos e
malucos, vendem remédios para a angústia e também haxixe em todas as singelas
barraquinhas montadas, é o comércio negro e obscuro, sem a fiscalização,
direitos ou devoluções, o que nos torna sagazes a primeira escolha, podes ser
derrubado, mas em algum momento sua ignorância preliminar, aprenderás o ritmo do mundo.
O que lhe apetece produz um desejo singular em seu peito, mas seus olhos não
podem demonstrar, o negócio deve ser indiferente a vontade, pois os preços
dependem de sua empolgação.
Caminho as vezes pela terra molhada,
areia da praia e algumas vezes pelos paralelepípedos de cimento, fortes e rígidos,
não tão solido quanto os de rocha, porém simétricos e planos.
Conhecer alguém por aqui entre as ruas lhe requer atenção e malandragem, o
ocidente não conhece o oriente, pois, onde jorra o leite e o mel, jamais terá a
maldição dos corvos ao mesmo tempo.
Não sei ainda quanto tempo ficarei por
aqui, um país diferente do meu, com pessoas e carros desgovernados, talvez seja
atropelado e fique por aqui minhas últimas horas, mesmo com a imponência dessa
terra, não pertence a mim e não a conheço, nem mesmo o nome sei.
Se for entender o que querem me dizer o
tempo todo ficaria maluco, as religiões e a cultura imposta tão fortemente,
faz-me recordar um ato malvado no Brasil, colocarem os pássaros em gaiolas
miseras de espaço e atribuir-lhes comida, e água, com o mimo de poder ouvir seu
canto a qualquer momento, como um prisioneiro, embora não tenha palavras para
expressar, é o canto negro do lamento que ecoa entre o sofrimento e a angústia
de ser fadado a cumprir uma pena que não lhes pertence. Sinto me assim, entre as
palavras e a loucura destes homens, assim como os pássaros possuem a imensidão
ávida dos céus para seu voo glorioso, teria eu a liberdade de viver sem a
dureza deste lugar?
Rogo para que a justiça seja borrifada das
nuvens e ao alvorecer me encontre em paz e sorrindo, gostaria de estar na
plenitude do manto verde da America, colorindo meus olhos com tanta imensidão
de beleza e imponência. O colosso do mundo mundo, florão e coração de beleza
mundial, sinto-te falta Brasil.
Estou vivendo cada dia com mais certeza de
que tudo que vivenciei não passa de uma pena entre milhares de outras de um
grande forro para travesseiros, sou pequeno e jovem, e percebo que toda a
idiotice no mundo não passa apenas de pessoas induzidas e enganadas pela estapafúrdia
de outrora que fora traçado um passado maculado, todavia sua macula é motivo de
glória e comodidade, como os trocadilhos nos beijam neste momento, se sempre
foi assim, por que mudares agora?
Fecho minhas pálpebras agora e assopro um
dente-de-leão e que as suas centelhas de vida caminhem para lugares onde querem
ir sem que ninguém as segurem, e assim, as entrego a liberdade.
- Marcos Leite
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