O descontentamento esta em meu peito, como um vácuo espacial, um fluxo de
pensamentos empoeirados e perdidos, presos sem que eu mesma possa exibi-los,
como uma sílfide que esta presa a uma fonte e que nunca o querubim poderá voar.
O vazio mora em mim neste período como um algoz, aprisiona meus pensamentos e
faz de mim apenas mais uma nula entre tantos outros por ai.
Não me
importa mais o que todos pensam de mim, estou aqui nas ruas, entre alguns
viadutos e minha morada deixou de ser meu lar, ainda não sei o porque, me vejo
imunda, velha e sem sonhos, a mente que tanto brilhava, tornou-se em uma bruma marítima
longínqua, até mesmo de mim, não sou mais a Nina que conheci, a desintegrei.
Uma de
minhas lembranças mais doentias foi de um jovem ser, a luz que iluminava meus
dias, as proporções de ser uma mulher feliz, certamente deslumbrada pela vida e
suas belezas, aos equívocos os arautos erguiam teus clarins, e aos sucessos, comemorações.
Estive por nove meses a tua espera, jamais esperei tanto tempo por alguém, uma
parcela de minha existência dimensionada em outra vida, um presente.
No verão,
quando ar quentíssimo escaldava intolerantemente, os preparativos da chegada se
iniciavam, os móveis tinham um brilho singular, as pessoas aflitas, e quanto a
mim a ansiedade havia consumido. Por algumas horas e alguns gritos, concebi
minha filha, bela, com olhos negros, poucos fios em sua cabecinha, e um pouco
menos ainda de pigmentação, eu a beijei e abracei por alguns segundos.
Teus
olhos me encararam como uma ternura jamais vista anteriormente, a pequena alma
que temia o grande mundo, se aproximava de tua progenitora, a fragilidade era
tão perceptível que ainda que eu pudesse omitir qualquer sombra de proteção, tua
individualidade era tremenda, uma outra pessoa, próxima a mim, mas com um
legado a ser construído, alguém que me faria tornar responsável por uma vida
toda, mesmo que isso não tenha acontecido.
A
pequenina cumpriu sua missão no mundo em menos de quatro horas, em meus braços
se despediu em um pueril sorriso de luz e carinho, apertou meu seio e meus
dedos pela última vez, o que esperei por tanto tempo, e que a acompanharia até pelos restos de meus dias. Eu fechei os olhos naquele momento para o mundo, e
me distanciei dele.
O que
pode importar a uma mãe quando parte ti se vai? Estou aqui, sozinha neste
grande mundo agora, com todos a minha volta se questionando o porque não terem
mais dinheiro ou prestígio. Eu não queria nada mais que alguns anos com minha
menininha. E aqui estou. Sem nada, nem ninguém, pois, nada me apetece mais.
- Marcos Leite